segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

A viagem do elefante - José Saramago

A história da vida do paquiderme Salomão, nascido em Goa na Índia e trazido para Lisboa, no século dezesseis, contada por José Saramago no livro "A viagem do elefante" é simplesmente hilária.

A curiosidade e o interesse dos portugueses foram diminuindo com o passar do tempo, até o elefante Salomão perder sua importância para o rei Dom João III, e para a rainha Catarina da Áustria, sua esposa.
O simpático Salomão, que tinha o indiano Subhro como cornaca, se viu sujo, desolado, esquecido pela corte portuguesa, e mal acomodado, próximo ao Mosteiro dos Jerónimos localizado perto das margens do rio Tejo.

Para dar uma utilidade a Salomão o rei aventou a possibilidade de presenteá-lo ao arquiduque austríaco Maximiliano II, casado com a filha do imperador Carlos V, da Espanha.
Consultado sobre o presente, o arquiduque confirmou a aceitação da oferta.
De imediato, para não haver retrocesso, o rei Dom João III ordenou que fosse preparada uma comitiva para transportar Salomão até a cidade de Valladolid, na Espanha, onde o arquiduque se encontrava hospedado. Para completar o presente de “grego”, junto à comitiva seguiu, também, o cornaca Subhro, responsável pelo tratamento de Salomão, com a intenção de não mais retornar a Lisboa.

O cornaca, que demonstrou muita inteligência e habilidade de relacionamento durante a viagem, terminou sendo admirado pelo comandante da comitiva por contar histórias sobre os deuses indianos Shiva casado com Parvati. A história dos deuses induziu o respeito da comitiva por Salomão já que Ganeixa, filho de Shiva, voltou a viver após ter sua cabeça substituída por uma de elefante.
Em contrapartida, o comandante tenta se sobressair, ao dizer que possui um exemplar do livro “Amadis de Gaula” do português Vasco de Lobeira, que versa sobre as cavalarias da península Ibérica. Vale lembrar que a versão original de “Amadis de Gaula” foi escrita por Rodriguez de Montalvo em 1508.

Apesar das dificuldades do percurso, a comitiva chegou ao Castelo Rodrigo, e aguardou as tropas austríacas para adentrar no território espanhol, para o encontro com o arquiduque Maximiliano. Enquanto isso, o comandante português, aproveitou para mandar de volta a Lisboa os trinta trabalhadores que acompanharam a comitiva, restando: a tropa, o tratador, e o elefante.
Após discussões entre o comandante português e o austríaco, para saber quem tinha o direito ou obrigação de levar Salomão até Maximiliano, resolveram negociar e seguiram juntos ao encontro do austríaco.

Enquanto isso, o cornaca observava o desenrolar das negociações, preocupado com o seu destino, a ser definido pelo arquiduque.
Ao se apresentar ao arquiduque, o cornaca foi orientado a colocar um gualdrapa sobre Salomão, e, surpreendido com a mudança do seu nome de Subhro para Fritz, assim como o do elefante de Salomão para Solimão.
Não adiantou questionar a decisão, os nomes foram mudados.

A tropa portuguesa retornava a Lisboa, e o cornaca seguiu junto com os austríacos, em direção a Viena. Acomodaram Solimão no mesmo barco que transportou, até a Itália, a tropa; os serviçais; o arquiduque; e sua mulher. Lá chegando, uma manobra do padre da Basílica de Santo Antônio de Pádua, convenceu o cornaca a levar Solimão até a porta da igreja. Na presença dos fiéis o elefante dobrou o joelho simulando um milagre.
Não ficou por menos, o arquiduque chamou Fritz para um esclarecimento, tirando-lhe com dificuldade, a confissão da farsa que ocorreu.

Sem alternativa para substituição do cornaca, Maximiliano prosseguiu a viagem sob neve, cujo percurso foi feito com dificuldade pelo animal desacostumado com o frio. Solimão comeu gelo por todos os lados. Sofreu o pão que o diabo amassou. Porém, aproveitou as duas oportunidades que lhe foram dadas para se redimir da simulação do milagre: a primeira quando a arquiduquesa caiu numa ribanceira e de pronto foi resgatada pelo elefante, e a segunda ao entrar em Viena enroscou a tromba numa criança de cinco anos devolvendo-a a seus pais no momento em que todos achavam que o acidente estava por acontecer.
Percebe-se que o treinamento dado por Fritz para simular um milagre na igreja, terminou por favorecê-lo, já que recebeu do arquiduque o reconhecimento pelos bons serviços prestados.

Bem, o fim da história do elefante Salomão ou Solimão está na página 255 do interessante livro de Saramago.
Os que não têm o hábito de ler o autor precisam de maior concentração e atenção para não se dissipar na leitura. O estilo de Saramago difere da forma tradicional, e no caso específico, a escrita é ainda mais descomprometida que as dos livros “Ensaio sobre a cegueira” e “As intermitências da morte”.
Saramago dá um show ao fazer citações e comparações com passagens bíblicas; ao enaltecer aspectos da inteligência de pessoas humildes; e ao registrar o afeto e preocupação do homem em relação aos animais.

Recentemente, em entrevista no Brasil, Saramago declarou que foi estimulado a escrever a história devido o fim que foi dado aos restos mortais do elefante Salomão.

Informações sobre o autor - José Saramago nasceu em 1922 em Portugal. Filho de agricultores, foi serralheiro, desenhista, funcionário público, tradutor e jornalista. Tornou-se conhecido internacionalmente com o romance Memorial do Convento. Recebeu o Prêmio Nobel de Literatura em 1998. Vive entre Lisboa e a aldeia de Lanzarote, nas Canárias.

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